terça-feira, 27 de julho de 2010






















A janela que escolhi tem várias formas e cores. 
Tem cheiro de mar. 
Tem silêncio.
Tem cuidado.
Tem brisa.
Tem calma.
Tem alma.

E amor escondido na retina.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

O peso é tão grande que me impede de andar. Impede no sentido que eu deveria conseguir empurrar e não movo para lugar algum. Nem o mundo nem a mim.

A liberdade poderia ser um lugar mais... livre.

sábado, 17 de julho de 2010

- Desço ali... na praça, está vendo?
- Ao lado das crianças correndo ou do basset tomando sol?

E então você lembra que escolhas precisam ser feitas todo o tempo e que nem sempre há como pesar cada uma delas. É o escuro, o incerto.

Teu peito abre um sorriso, você fecha os olhos, pula. Por alguns segundos não importa o que virá: a sensação de solidão dá sentido à existência. Respiração ofegante e a certeza de que escolher foi ainda mais importante que a própria escolha.

sábado, 10 de julho de 2010

Ela contando:

Tuas mãos pequenas ergueram no ar o castelo onde descansei durante anos as cores do pôr-do-sol, num tempo em que o castanho e o oliva se encontravam certamente na frente do espelho que sabiamente colocaste no meu quarto, ao lado direito da grande cama em marfim e ouro que veio de terras ainda mais longínquas que a tua. Eu amava o cheiro doce das tuas botas adentrando o salão principal e a suavidade da tua tez iluminada de sol. Admirava a saudade intensa e inesgotável que os teus gostos me provocavam naquela espera enorme à qual me submetia e desejava cada encontro com mais delicadeza.

Estive cercada de teus fiéis escudeiros naquela redoma onde gentilmente me colocaste para me proteger dos perigos de noites quentes. Não me aborreci pela falta de companhia nem por teres tomado minha vida daquela maneira - eu sabia da necessidade de entrega e percebia nos teus olhos que era porque precisava ser. Nem ousei questionar teus métodos; nem tentei escapar do teu corpo cálido; nem fui.

Abri as janelas a cada nascer do sol para contemplar o horizonte que me deixaste e, incredulamente, numa manhã branca, entendi que não mais voltarias para o meu quarto, meus gestos, meus tons de vermelho - havíamos nos perdido entre o jardim e tuas partidas constantes para além do oásis. Soube assim que caminhaste sob o tapete carmim e compreendi que teu semblante havia mudado tragicamente: não existia nada além do cinza penetrante dos teus olhos. Te observei silenciosa e secretamente enquanto te aproximavas e o mundo se dissolvia ante teus passos longos e duros. As cores desapareceram.

Me deste um trono, uma coroa e as asas que me lançaram do terraço naquele dia chuvoso e triste em que te deixei me olhando da sacada. E nunca mais foste embora.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

uma parte que não tinha

não tem sol nem solução
não tem tempero no meu dia
não faz mal se a tradição nos traduz outra alegria
não ter pressa dá a impressão de que a tarde virou tédio
não tem bala, belo, bola ou balão
não tem bula meu remédio
acho que me perdi numa excursão
que fiz na tua certeza e na contradição 
(que não tem cura)
acho que me perdi numa excursão
que fiz na tua palavra e no teu palavrão
[...]

acho que me perdi numa excursão

no meu único verso o sol é solidão
não tem mal, nem maldição
não tem sereno no meu dia
não tem sombra e assombração
não tem disputa por folia
tem bola de capotão, capitão capture essa menina
tem saudade e saudação
tem uma parte que não tinha... 
uma parte que não tinha... uma parte que não tinha...
de quando eles sabem aquilo que tu adivinhou e desenhou num papel cartonado em cor desbotada e mandou no meio da minha viagem pra confortar as lágrimas que mal tinham se formado no canto do olho borrado e disse sutilmente que tua-mão-na-minha. 

terça-feira, 6 de julho de 2010

traços

Ar frio no rosto, chocolate pra esquentar. Aquele casaco saído do armário, os olhares diferentes na rua, o gosto do mundo novo. Completamente insinuante, sorrindo de canto de boca. Os rumos que mudaram, aquela cor desbotando até chegar ao loiro intenso do sol cortando a pele morena em pleno meio-dia. E dá vontade de correr e gritar e querer e sorrir. Vontade de madrugadas na rua, risos sem motivo, nuances surpreendentes, descobertas na esquina. E o desejo bruto de ler o enigma constante que sai dos olhos e pára na boca úmida e escarlate. De quem? - me pergunto com certeza doce de resposta. Assim o diálogo finda, como os dias nublados e densos do ontem. Como o cheiro de flor recém desperta. Como eu, voando em direção ao mar.

Vês?